sábado, 24 de outubro de 2009

espera

Começara com um beijo, e transformara-se algo superior. O sangue dentro de minhas veias...E penso em ninguém mais. Nunca houve de tanto acreditar, mas nisto acredito. Sou incompleto sem ti, e mataria por teus delicados lábios. Tudo tornou-se agora tão diferente, emoções incendeiam-me. Possuo um toque sem vida alguma, tal distância não deixa restarem dúvidas. Tanto receio de um todo, e, contudo, uma parte de mim ainda acredita. À medida que os anos vão-se embora, tu abres-me os olhos. Estou perdido, solitário, amedrontado e escondido. Tua ausência faz-me cego. Quando o mundo desmoronar, e os céus iniciarem sua queda; quando os dias forem longos e remotos, e minha pele petrificar; quando a dor parecer demais intensa, e surgir certa arritmia em meu coração. De nada preciso. Esperar-te-ei.

sexta-feira, 23 de outubro de 2009

dourado

"Por favor, cuida-te." Foram minhas últimas palavras, pouco antes que o operador fizesse-nos disconectados. Se tu puderes ouvir-me agora, sabe que tenho um solene voto: juro fazer o meu melhor para resolver esta situação.
Primeiramente, explicar-te-ei o porquê de ter causado tanta água, e jamais consertado o vazamento em um cano que acabou por afogar-nos sob nosso próprio teto. Um vazio copo não mente, logo preenchi-me o apetite, e cruzei os dedos para que uma boa divindade cuide de mim e de ti. Agora que descobri-te, amarrarei cordas ao teu redor, e certificar-me-ei de que qualquer garrafa nunca mais te importune. Prometo, dessa vez. Estou me desinfectando, sinceramente; para deixar claro que o mal não nos cause nenhum novo prejuízo.
Como desejo que tuas vitórias vendidas a mim houvessem sido por um bom pai, ao invés de um mentiroso sem qualquer importância. Sou eu assim tão velho, ignorante, ou lento demais? Para perceber a perda de meu bilhete dourado de volta para casa.

quinta-feira, 22 de outubro de 2009

anoitecer

Ao suave cair de uma tarde memorável, em nada impedem minha relutância contra o fim de tão lendário momento e meu desejo de eternamente permanecer neste cenário, que brusca e simplesmente apaga. Em uma gradativa e inconveniente obra do acaso, a doce brisa, sem prévio aviso, pára de soprar. Deita-te os sedosos cabelos, dissolve a agora antiga fragrância. Teu enrubesciado semblante é abandonado em um recente pretérito, e em seu lugar forma-se, em contraste, uma frívola e pálida expressão vazia. Desfaz-se o toque, a nova ausência de contato provoca-me a mais intensa e física dor. Minuciosos elementos próximos perdem o brilho e, sob uma total escuridão, escondem-se. Afunda a harmônica paz na terra gélida. Acompanhado, o lento fechar de teus não mais vistosos cílios faz desaparecer teu invisível sol, e preenche-te de plena apatia. Celebremos a noite.

terça-feira, 20 de outubro de 2009

paralisia

Banhado pelo agradável calor do sol de teus olhos dourados, coberto pela doce e leve penumbra de teus intermináveis cílios sombrios, me encontro. Delicada e sutilmente esvoaçantes à calma brisa de serena juventude, teus cabelos negros entregam-me a incomparável fragrância do que dura para sempre. Um toque macio das pontas de meus dedos em teu rosto desfaz a surrealidade formada por tamanha perfeição. Sinto-te. Floresce-me. Ao nosso redor pequenas simplicidades tornam sua insignificância em essencial beleza. Acompanhado por calmaria de tal magnitude, despedaço-me envolvido em teus acolhedores braços; dissolvo-me junto às nulas preocupações em meio à imensa pureza que, por completo, nos cerca; enfim paraliso. Breve paraíso.

segunda-feira, 19 de outubro de 2009

instante

Suficientemente raros são momentos cuja delineada duração é tão longa quanto achas que deveria ser. Às pressas, teus instantes comuns ocorrem demasiadamente repentinos, os mais saborosos, terminam sem que percebas a sutileza de ínfimos ponteiros suavemente movendo em teu cristalino relógio. Em evidente oposição, vêm a ti os mais presentemente dolorosos, nos quais um único segundo parece tirar-te cada remanescente faísca de existência. Questiona. Haverá possível modo de deliberadamente retroceder, reviver, tão preciosos instantes? Pesada e sufocantemente estagnado com inconveniente fardo? Sê-lo-á. Meras consequências de um não mais importante, deveras desmerecido, e mesmo despercebido tempo. Avançar.

quinta-feira, 15 de outubro de 2009

afogo

Imagens turvas percorrem minha intransitável mente, sombras coloridas e invisíveis, espíritos evocados por memórias do que um dia fora real, do que fora perfeito, presente. Ignorante sinto-me para com elas, demasiado lento raciocínio para desvendá-las, extrema satisfação somente por admirá-las, por estar em sua presença. Uma brisa torna claro o indecifrável, tais confusas manchas transformam-se em pura definição. Alcanço-te. Infindável conforto preenche-me por completo, afundo em teu abraço, afogo em tua felicidade, abandono o primitivo e irracional desejo de respirar através da simples eternidade. Imploro por não despertar; sonho puramente impossível. Um baque surdo faz-me retomar a indesejada plena consciência.
Retorno à imunda superfície.

quarta-feira, 14 de outubro de 2009

ruínas

se enterro-me entre escombros vazios, restos de uma catástrofe subjetiva, tuas mãos já não conseguem erguer-me das longas ruínas solitárias, espectros de faltas cometidas previamente por um não mais corrente ser racional. logo afundam-me em um poço de escuridão miserável onde preciosidades tornam-me simplesmente nada. grito-te. de minha garganta gasta e inutilizáveis músculos atrofiados abandono um singelo ruído ininteligível, sufocado por densas penumbras silenciosas, grotescos fios de uma agonia morta; fria em gelo corre minha escassa circulação, e, relutantemente, constato: em nada interfiro-te o meu pesar. em nada interfere-me o teu.
rumores. silêncio.

olha-me

emudeça-te o falar e simplesmente enxerga-me, quando tua luz enfraquecer em tom de sépia mutilada por julgamentos exteriores sem precedência.
cala-te a voz até então ensurdecedora e apenas fita-me por completo enquanto transcendo-te todos os antigos objetivos já tardios e demasiadamente gastos. através de minha pele perolada encontro atrito contra tua bastante interiorizada lisa força sequencial em apedrejar-me com frívolas ações devastadoras geral e completamente cessantes, dilacerando-me o sentir.
levanta.
encontra-me.
fecha-te, pois, a boca e, só então, olha-me.

terça-feira, 13 de outubro de 2009

desejos

que são estes desejos que, ao passar por minha mente, hão de dragar faíscas de companheirismo, transformando-as em berços de fagulhas remanescentes; acendendo-te o rubor de incendiados confrontos contra uma sociedade já arrastada por tais? o que trazer-nos-ão? passividade, enquanto coloco meus olhos caramelados sobre teu semblante cor de âmbar, cesto de frutos suculentos repletos de encantadoras gotas. serão lágrimas de arrependimento sólido? ou possíveis canções vagarosamente ascendentes, caminhando e convergindo para um ponto comum de exagero e jovialidade, teoricamente nossas ganâncias. transforma-me em teu. arranca-me o coração, antes meu, agora lembrança.

rouxinol

fizera-me estático e forçado a sentir o esplendor que em outrora paralizara-me o viver, eu, nós, liberdade incapacitada por uma tênue fronteira entre teu coração e minh'alma, agora aquecida de um supremo e resplandescente sonhar abstrato e fora de si, assim como o rouxinol escancara suas asas, penas, belas múltiplas cores, e plana entre correntes térmicas de verões mornos, vistos como presentes outonos já passados, é o nosso louvor de esperança aberta, é tua voz suavemente clara quando adentra-me os ouvidos apaixonados de um pensar rebuscadamente eloquente e tentador. que clama por voar em meio a teus braços noturnos de abafar-me a solidão repleta com arte taciturna e cuidadosa que encerra este deveras exausto fardo de ser.

segunda-feira, 12 de outubro de 2009

amo-te

saudades. de teu toque em minha nuca, cujos pelos eriçavam-se à medida em que teus braços aproximavam-se de meus ombros, abraçando-me, teu perfume desgastado pela brisa intensa de uma primavera póstuma, agora gélida, durante outubro em sua máxima plenitude, encantando-me o olfato enquanto acariciava-te a maçã do rosto com meus dedos trêmulos de uma fineza quase quebradiça, ansiando por um beijo saudoso e caloroso que compensaria a distância de longas estações, tão ensolaradas pelo quintal e, no entanto, tão tempestuosas dentro de meu peito. nesse momento, teus lábios delicadamente tocaram-me a orelha e, em um ato de doce sincronia, afastaram-se. ao que pude ouvir uma suave voz coberta em um hálito jovial de hortelã que disse-me: amo-te.

prefácio

teus lábios são dois pilares rosados de minha não tão importante existência, contrária a este universo de luzes e movimentos complexos, diversos e coloridamente únicos que, quando encostam nos meus, trazem-me o brilho de paz harmônica solitária, como um inverno que chega atrasado em um julho feroz com suas folhas amareladas e excepcionalmente maravilhosas. tua pele branca como um luar delicado de primavera em meio a nuvens embaçadas com o sabor delicioso da paixão açucarada que é amar-te, durante um ano intenso e excêntrico, enquanto os pássaros voam para um sul já de temperaturas tenras, fugindo de um norte escurecido em uma neve brilhante e ostentadora de sentimentos universalmente sentidos, e lindamente azulados, como o brilho de teu olhar.